Quinta-Feira, 20 de Fevereiro de 2020
Após atritos causados pela proposta de recriar o Ministério da Segurança Pública, no fim de janeiro, e os debates em torno da cobrança do ICMS, no início de fevereiro, um grupo de 20 governadores divulgou, nesta segunda-feira, 17, uma carta em que critica o presidente Jair Bolsonaro por declarações sobre Adriano Magalhães da Nóbrega, morto em confronto com a polícia baiana no dia 9 e acusado de chefiar uma milícia. A carta seria uma maneira de tentar parar ataques do presidente que, segundo governadores ouvidos pelo Estado, estão "destruindo as pontes" com as administrações estaduais.
A reação dos governadores a Bolsonaro começou a ser construída no sábado, logo após o presidente afirmar que o governador da Bahia, Rui Costa (PT), "mantém fortíssimos laços" com bandidos e que a "PM da Bahia, do PT" foi a responsável pela morte do miliciano, conhecido como capitão Adriano. Em uma longa postagem nas redes sociais, Bolsonaro comparou a morte de Nóbrega ao assassinato do prefeito petista Celso Daniel, em 2002, e criticou as gestões do PT. Segundo fontes do Palácio do Planalto, a decisão de fazer a publicação foi tomada pelo próprio Bolsonaro.
A declaração do presidente gerou uma onda de apoio a Costa no grupo de WhatsApp mantido pelos chefes dos Executivos estaduais. Alguns governadores defenderam uma resposta imediata, alegando que, a qualquer momento, poderiam virar alvo da artilharia do presidente. Lembraram que o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), foi responsabilizado pelo vazamento do depoimento de um porteiro que ligava o nome de Bolsonaro à investigação da morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e que mesmo aliados foram criticados e perseguidos por grupos de internet ligados à família Bolsonaro.
Eleições
A avaliação entre os governadores é a de que Bolsonaro os ataca porque vê alguns deles como potenciais adversários nas eleições de 2022: além de Witzel e Rui Costa, o paulista João Doria (PSDB) e o maranhense Flávio Dino (PCdoB) têm os nomes ligados à disputa presidencial. Segundo os governadores, a relação do governo com eles tem se deteriorado "em ritmo acelerado".
Em conversas no grupo de WhatsApp, quase todos os governadores condenaram as declarações do presidente, criando uma união da direita à esquerda. Partiu de Witzel a ideia de escrever uma carta aberta contra Bolsonaro, o que logo foi apoiado pelos outros. O texto publicado ontem diz que as declarações do presidente "não contribuem para a evolução da democracia no Brasil".
A carta também menciona o episódio em que o presidente desafiou governadores para que reduzissem o ICMS, "imposto vital à sobrevivência dos Estados". "Está feito o desafio. Eu zero o (imposto) federal hoje e eles (governadores) zeram ICMS", declarou o presidente em 5 de fevereiro.
O texto afirma, ainda, que "equilíbrio, sensatez e diálogo para entendimentos na pauta de interesse do povo é o que a sociedade espera". Houve, no entanto, uma preocupação de que a carta não fechasse a porta para o diálogo. Apesar de dura, ela termina com um convite para Bolsonaro participar do Fórum Nacional de Governadores, em 14 de abril.
"O que os governadores querem é ser chamados para discutir como melhorar a saúde e a educação, e não ser agredidos de forma regular e permanente pela Presidência", afirmou Rui Costa ao Estado. "Esperamos que haja uma mudança radical do presidente e que ele passe a nos respeitar."
Um dos primeiros apoiadores da carta, Doria também pediu diálogo. "Os governadores querem um entendimento pelo diálogo, que é a forma democrática e correta para busca das melhores alternativas de políticas públicas. Sem diálogo e sem entendimento não há democracia", disse. Após se eleger amparado no voto bolsonarista, o tucano tem feito oposição ao presidente desde o ano passado.
Imposto
A ala anti-Bolsonaro entre os governadores tinha perdido força no início do mês, quando o ministro da Economia, Paulo Guedes, aceitou recebê-los para discutir a questão do ICMS. Os ataques a Rui Costa, porém, reorganizaram o grupo. "O presidente Bolsonaro não quer aproximação com o Congresso, não quer aproximação com os governadores. Mas nós todos fomos eleitos", afirmou o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), que sempre teve bom trânsito com o presidente. "Só estamos pedindo um pacto federativo para recuperar a República. Se ele quer se afastar da política, não quer os governadores, isso é u ma decisão dele."
Procurado, o Palácio do Planalto disse que não iria comentar a carta dos governadores.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo
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