“Nem com 81 assinaturas pauto o impeachment de ministro do STF”, diz Presidente do Senado. A afirmação, frustra a tentativa de bolsonaristas, que anunciaram ter conseguido as 41 assinaturas necessárias para a abertura do processo
Quinta-feira, (07) de agosto de 2025
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), foi direto ao ponto: descartou completamente a possibilidade de dar seguimento ao pedido de impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. “Nem se tiver 81 assinaturas, ainda assim não pauto impeachment de ministro do STF para votar”, afirmou Alcolumbre, segundo relatos do encontro ouvidos pela Coluna do Estadão, do jornal O Estado de S. Paulo.
A frase, segundo a reportagem, foi dita com visível irritação, a ponto de ele mesmo se incluir simbolicamente na totalidade do Senado para reforçar que, mesmo com o apoio unânime da Casa, não aceitaria abrir o processo. O Senado é composto por 81 senadores.
A declaração representou um duro revés para os aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, que, no mesmo dia, anunciaram ter reunido as 41 assinaturas exigidas para formalizar o pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes. A estratégia é uma reação da ala bolsonarista às decisões do ministro, relator de diversos inquéritos contra membros do grupo, inclusive envolvendo os ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023.
Entre os presentes na reunião estavam nomes de peso da oposição, como os senadores Rogério Marinho (PL-RN), Tereza Cristina (PP-MS) e Marcos Rogério (PL-RO). Apesar da negativa de Alcolumbre, o senador Carlos Portinho (PL-RJ) reagiu com firmeza e traçou um paralelo com o caso de Dilma Rousseff. “Um processo de impeachment não é fruto de vontade do presidente da Casa. É um movimento de maturação e tempo. O ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, também não ia votar o impeachment de Dilma Rousseff. Mas uma hora o vento muda”, declarou.
Portinho também indicou que o grupo continuará pressionando. “Uma coisa de cada vez. Agora tem 41 assinaturas. Depois conseguiremos apoio para ter 54 votos. Vamos comemorar a vitória de hoje”, disse.
De acordo com o rito previsto, cabe ao presidente do Senado avaliar se aceita ou não a denúncia. Caso aceite, ela é lida no plenário da Casa na sessão seguinte. Em seguida, forma-se uma comissão especial composta por 21 senadores para análise preliminar do caso. Esse colegiado tem até dez dias para emitir um parecer sobre o prosseguimento do processo.
Se o relatório for favorável, a abertura do processo é submetida à votação em plenário, onde é necessário o apoio de maioria simples — 41 dos 81 senadores — para que o pedido avance. Superada essa etapa, inicia-se formalmente o processo, com prazos regimentais definidos, sendo exigida então uma maioria qualificada de dois terços (54 senadores) para a cassação do ministro.
Apesar de a Constituição prever essa possibilidade em casos de crimes de responsabilidade, jamais um ministro do STF foi afastado por decisão do Senado. Em 134 anos de história da Corte, apenas um episódio pode ser citado como precedente: em 1894, o Senado rejeitou a indicação de Cândido Barata Ribeiro, médico de formação, por não considerá-lo detentor do “notório saber jurídico” exigido pela Constituição para exercer a função de ministro do Supremo.
O comando é de Alcolumbre
Mesmo com essa base de apoio, Alcolumbre deixou claro que não se sente pressionado. A fala sobre as 81 assinaturas é simbólica, já que esse número corresponde ao total de cadeiras do Senado. Em outras palavras, mesmo que a totalidade dos senadores endossasse o pedido, o parlamentar não colocaria a pauta em votação.
A atitude gerou frustração visível no grupo de oposição, que vinha se articulando nos bastidores para pressionar pela abertura do processo. A postura de Alcolumbre, entretanto, revela não apenas um alinhamento estratégico com a base governista, mas também uma tentativa de manter o equilíbrio institucional diante de uma crise recorrente entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.
Portinho compara Davi Alcolumbre a Cunha
Um dos líderes da investida bolsonarista, o senador Carlos Portinho (PL-RJ), reagiu com uma declaração forte, comparando a situação à de Eduardo Cunha, que presidia a Câmara dos Deputados durante o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
“Uma coisa de cada vez. Agora tem 41 assinaturas. Depois conseguiremos apoio para ter 54 votos. Vamos comemorar a vitória de hoje”, afirmou Portinho, tentando manter o entusiasmo da base conservadora e reforçar a ideia de que o caminho para o impeachment será longo, mas viável.
A referência a Cunha não foi por acaso. Em 2015, mesmo sob críticas e pressões, Cunha decidiu pautar o impeachment de Dilma, o que culminou na cassação da ex-presidente no ano seguinte.
Portinho quis sinalizar que, em sua visão, Davi Alcolumbre deveria fazer o mesmo abrir espaço para que o Senado decida em plenário, sem travas institucionais vindas da presidência da Casa.
Tensões institucionais se aprofundam
O episódio expõe mais uma vez o conflito crescente entre alas bolsonaristas e o Supremo Tribunal Federal. Alexandre de Moraes, alvo do pedido de impeachment, é uma das principais figuras no combate à desinformação e aos atos antidemocráticos, o que o transformou em figura central nos embates com apoiadores de Bolsonaro.
Ao rejeitar publicamente a ideia de pautar o impeachment, Alcolumbre não apenas enterra momentaneamente o pedido, como também reforça sua posição como um dos principais freios à ala mais radical da direita no Senado.
Embora os 41 nomes tenham sido reunidos, um feito inédito contra um ministro do STF, o processo depende exclusivamente da decisão do presidente do Senado para ir à votação. Não se trata de uma imposição automática, mas de um rito interno que requer autorização para tramitação.
Caminhos incertos à frente
Se a oposição deseja seguir em frente com a proposta, terá de articular uma mudança na presidência do Senado, ou conseguir uma reinterpretação do regimento interno que force a deliberação. Ambos os caminhos são difíceis e politicamente arriscados.
Enquanto isso, a crise entre os Poderes tende a se intensificar. Os ataques ao STF por parte da base bolsonarista, aliados à resistência do Congresso em dar andamento ao impeachment, podem reacender manifestações, discursos polarizados.
A fala de Alcolumbre, por mais categórica que tenha sido, não encerra o capítulo. Pelo contrário, ela abre um novo campo de embate institucional, onde interesses políticos, jurídicos e eleitorais se misturam em um cenário já fragilizado.
A decisão de Davi Alcolumbre impacta diretamente o cenário político e reforça a crise entre o Legislativo e o Judiciário. Mesmo conseguindo assinaturas suficientes, o impeachment de Moraes ficará travado, e a batalha política está longe de terminar.
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