Terça-feira, 16 de fevereiro de 2021
Diante da insatisfação de caminhoneiros com o preço do diesel, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vem dizendo que o governo estuda a redução de impostos sobre os combustíveis. As falas de Bolsonaro dão a entender que uma diminuição no valor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) levaria, automaticamente, a uma queda no preço dos combustíveis nos postos. Mas, na prática, o valor que o consumidor paga para abastecer um veículo leva em conta vários fatores além do ICMS.
No caso do diesel, segundo informações da Petrobras, 23% do preço corresponde a tributos: 14% de ICMS e mais 9% de PIS/Pasep e Cofins. já para a gasolina, impostos e contribuições pesam mais. Somadas, as cobranças de ICMS, Cide, PIS/Pasep e Cofins representam 42% do valor cobrado nas bombas.
Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) mostram que o valor dos combustíveis derivados do petróleo vem aumentando nos postos (veja no gráfico abaixo). O acréscimo, no entanto, não está relacionado a reajustes nos tributos.
"O preço [dos combustíveis] vem aumentando por causa dos reajustes da Petrobras, que vão gerando aumentos em cadeia", diz Rodrigo Leão, coordenador técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e pesquisador visitante na Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Na segunda-feira (8), a Petrobras anunciou o reajuste mais recente nos preços (gasolina subiu R$ 0,17 nas refinarias). Mas, antes disso, outros aumentos já haviam sido anunciados em 2021.
Os reajustes ocorrem de acordo com a política do Preço de Paridade Internacional (PPI), estabelecida pela Petrobras em 2016. Pelo mecanismo, o preço cobrado pela empresa nas refinarias varia de acordo com o valor do petróleo no mercado internacional (cobrado em dólar) e, também, com um cálculo que leva em conta os riscos que são parte da atividade.
A questão é que, mesmo com os aumentos, o preço cobrado pela Petrobras ainda está defasado em relação ao praticado no mercado internacional - ou seja, os valores devem subir ainda mais nos próximos meses.
O que o governo pode fazer para reduzir o preço?
Mexer na política de preços da Petrobras - uma das reivindicações de entidades que representam os caminhoneiros -, porém, parece estar fora de questão. O próprio presidente Jair Bolsonaro afirmou, no início da semana, que o governo "não pensa nem pode" interferir na empresa. Isso porque uma possível intromissão do Executivo na Petrobras poderia prejudicar seu desempenho.
A título de exemplo, na semana passada, o anúncio de uma mudança na periodicidade dos reajustes provocou repercussões negativas no mercado financeiro, com a queda dos valores de ações da empresa. Segundo comunicado publicado pela Petrobras, os preços dos combustíveis que saem das refinarias podem permanecer inalterados por até um ano.
O anúncio de um novo reajuste nos valores, na segunda-feira (8), ajudou a acalmar os ânimos. "Esses ajustes vieram depois de o governo reafirmar que não vai interferir na política de preços da companhia. (...) Vemos o aumento como positivo porque essa tem sido uma das principais preocupações de investidores neste ano", diz relatório produzido pelo banco Goldman Sachs.
A opção do governo para baixar o preço, portanto, é mexer nos impostos. O governo federal, no entanto, só é responsável por Cide, PIS/Pasep e Cofins. O ICMS, que foi alvo das declarações de Bolsonaro, é de competência estadual.
"Não cabe ao governo federal falar em ICMS. Além de tudo, o ICMS sobre combustíveis gera uma arrecadação muito importante para todos os estados", afirma Gilberto Luiz do Amaral, presidente do Conselho Superior do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).
Uma opção seria o governo propor a diminuição das contribuições federais (PIS/Pasep, Cofins e Cide) sobre os combustíveis. Foi o que o governo de Michel Temer (MDB) fez em 2018: depois da greve dos caminhoneiros, o Executivo zerou o valor da Cide sobre o diesel. O problema é que medidas desse tipo têm impactos orçamentários - e, no momento, nem a União nem os estados estão em condições de reduzir a arrecadação.
De qualquer forma, alterações desse tipo teriam, necessariamente, que ser aprovadas no Legislativo (seja nas Assembleias estaduais ou no Congresso Nacional). No Twitter, o presidente Jair Bolsonaro chegou a dizer que o governo enviaria um projeto de lei ao Congresso, buscan.
Sem detalhes, no entanto, fica difícil saber se a ideia pode mesmo ser levada adiante. "Temos que aguardar a proposta concreta para saber o que é ou não possível fazer. Mas, politicamente, acho difícil haver alguma alteração [no ICMS], que é de competência estadual", diz Luciano Bernart, presidente executivo da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst).
Por Giulia Fontes
Do UOL, em São Paulo
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