EQUIPE ECONÔMICA DE BOLSONARO QUER REMANEJAR VERBA DO ORÇAMENTO

Segunda-feira, 29 de Outubro de 2018
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, quer fazer alterações no Orçamento do ano que vem. Um de seus aliados procurou o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), poucos dias antes da eleição para sondar se ainda daria tempo de fazer mudanças após o pleito, caso o capitão reformado chegasse à Presidência.

Um dos temas em estudo é remanejar parte da verba que hoje é destinada a investimentos. Essa parcela já está estrangulada em cerca de R$ 27 bilhões, mas pode sofrer mais recortes. O assessor econômico de Bolsonaro, Paulo Guedes, tem interesse em olhar no detalhe as contas de 2019. O governo começa amarrado por um dos Orçamentos mais engessados da história.

Michel Temer passará o bastão com as despesas públicas em 19,3% do PIB (R$ 1,4 trilhão). Desse total, 93% estão comprometidos com gastos obrigatórios, sem margem de manobra.

No primeiro ano de mandato, o governo terá à mão apenas R$ 102 bilhões em recursos parcialmente manejáveis. Boa parte do valor contempla gastos que não podem ser cortados, como a conta de luz e segurança de prédios públicos.

Durante a transição, Guedes terá de decidir sobre temas urgentes na área econômica. Embora ele só assuma o cargo de ministro em janeiro, deverá dar o comando em medidas que terão implicação nas contas públicas durante o mandato de Bolsonaro.

Uma decisão das mais emergenciais trata da subvenção ao diesel, que vence em dezembro. O governo está pagando às empresas para praticar preços mais baixos do que os de mercado e abriu mão de parte da arrecadação dos impostos sobre o combustível.

As duas medidas nasceram na paralisação dos caminhoneiros, em maio, quando o governo se comprometeu em reduzir o preço do diesel. O compromisso termina em 31 de dezembro e há o temor, entre os aliados de Bolsonaro, de que o preço nas bombas dê um salto logo na chegada do eleito ao poder.

A subvenção até o fim do ano deverá custar R$ 9,5 bilhões --até setembro o governo desembolsou cerca de R$ 1,6 bilhão e prevê pagar mais R$ 1,5 bilhão, que está em atraso, nos próximos dias. Não há previsão no Orçamento de 2019 para gastos dessa magnitude com a política.

Caso o dólar e os preços do petróleo sigam em queda, como esperam integrantes do governo, a saída da subvenção será "indolor". Na sexta-feira (26), quando o dólar fechou a R$ 3,65, por exemplo, os cálculos apontavam que a necessidade de subvenção para moderar os preços externos estava em R$ 0,05, bem abaixo do teto de R$ 0,30 fixado pelo governo.

Se o declínio prosseguir, a subvenção deixará de ser necessária e, dessa forma, o degrau será menor --vai se restringir à renúncia de R$ 0,16 por litro de diesel em tributos (Cide e PIS/Cofins). Se o mercado externo não ajudar, porém, a equipe econômica de Temer já tem opções que serão apresentadas a Guedes.

Caso o novo governo opte por manter a subvenção em 2019, terá de remanejar verba de outra área para encaixar a despesa no Orçamento, sob pena de furar o teto que limita os gastos públicos.

Desde o início do segundo turno, Bolsonaro tem negociado com deputados e senadores mudanças no Orçamento para o ano que vem. Aliados do dizem que o eleito pretende reforçar a verba para segurança e infraestrutura.

Bolsonaro, que prometeu não ceder ao jogo político em nome da governabilidade, terá ainda seu primeiro desgaste com o Congresso ao ter de carimbar quais serão os parlamentares atendidos por R$ 14,7 bilhões em emendas parlamentares que constam no Orçamento de 2019. A equipe econômica de Temer espera pelo comando do eleito.

O reajuste salarial dos servidores também pode colocar a categoria contra o novo presidente logo de partida. Embora a gestão Temer tenha previsto a despesa no Orçamento de 2019, adiá-lo para janeiro 2020 abriria uma margem de cerca de R$ 5 bilhões no primeiro ano de governo de Bolsonaro. Para tanto, a decisão precisa sair antes da posse.

Outros dois desafios, esses envolvendo a relação da União com estados e municípios, esperam pela nova equipe.

O primeiro é o pagamento a estados pela Lei Kandir. O governo compensa os entes para que eles não cobrem ICMS sobre exportações. Os gastos da União com esse repasse variam, por ano, de R$ 1,8 bilhão a R$ 3,9 bilhões. Mas os parlamentares querem obrigar a União a desembolsar nove vezes mais: R$ 39 bilhões.

A atual equipe econômica não conseguiu superar o impasse, e o TCU (Tribunal de Contas da União) está mediando a discussão. Caberá à equipe de Bolsonaro convencer os ministros do tribunal de que a conta deve prevalecer para não ver o gasto disparar.

Mal sentará na cadeira, Guedes também deverá responder ao pleito de prefeitos e governadores de criação de uma linha de crédito para o pagamento de precatórios (despesas decorrentes de ações judiciais perdidas pelo governo).

Criada no fim de 2017, via emenda constitucional, a linha de crédito poderá custar à União até R$ 100 bilhões em seis anos (valor que governadores e prefeitos devem pagar em precatórios até 2024).

A cidade de São Paulo é a principal interessada, uma vez que tem a maior dívida do país (R$ 18 bilhões). Embora reserve parte de suas receitas para o pagamento de precatórios, a dívida cresce ano a ano.

Com as contas apertadas, prefeitos estão contando com a linha de crédito federal já em 2019, como forma de atender aos cronogramas anuais de pagamento desse passivo entregues ao Poder Judiciário. Bolsonaro não pode escapar da despesa e tem apenas de decidir de que forma a conta entrará no Orçamento dos próximos anos.

São duas alternativas. A primeira prevê o empréstimo por meio de bancos estatais. A União arcaria com os subsídios para baixar artificialmente a taxa de juros do financiamento --o Congresso limitou os encargos a 6% ao ano mais a inflação medida pelo IPCA (abaixo da taxa de juros de mercado).

É a opção menos indicada pela atual equipe econômica, porque levaria a cortes de verba em outras áreas do governo para socorrer estados e municípios endividados.

A segunda opção é o empréstimo direto da União, mas isso ainda depende de como serão estruturadas as operações financeiras. A saída não comprometeria o Orçamento, mas aumentaria a dívida bruta, que já está em acelerada expansão.

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