ANSIEDADE. O TEMOR QUE NÃO PASSA

Sábado, 28 de maio de 2016
Quem nunca ficou com um friozinho na barriga na primeira vez em que foi fazer uma apresentação em público? Não há nada de anormal nisso, diz a ciência – trata-se apenas de um estresse passageiro. Mas se as reações a episódios do gênero durarem pelo menos seis meses e piorarem se não forem tratadas, o quadro muda de figura. Casos como esses, caracterizados pelo medo irracional e pela incerteza quanto ao que vai acontecer, pertencem a uma categoria específica da literatura médica: as desordens de ansiedade.

Em geral, esses distúrbios ocorrem simultaneamente com outras doenças físicas ou mentais, como o consumo abusivo de álcool e de outras drogas, o que pode disfarçar os sintomas ou torná-los ainda piores. Em alguns casos, essas doenças paralelas precisam ser tratadas antes a fim de que o paciente responda ao tratamento. Mas os estudiosos consideram tais problemas perfeitamente controláveis, e a cada dia surgem novos tratamentos capazes de fazer as pessoas acometidas por eles levarem uma vida normal.

Um dos mais conhecidos entre eles é o transtorno do pânico (também conhecido como síndrome do pânico, ou TP). Esse distúrbio, que segundo estudos atinge entre 2% e 4% da população mundial, refere-se a ataques de pânico que ocorrem a qualquer momento (incluindo o período de sono), repetindo-se ao longo do dia ou da semana. Assim como a incidência, os ataques também variam quanto à velocidade: eles podem vir lentamente ou de forma repentina. Em geral, seu pico dura dez minutos, mas alguns sintomas podem permanecer por um tempo bem maior. Além de uma imperiosa sensação de ansiedade, os ataques produzem sintomas físicos variados, de acordo com a pessoa (veja o quadro “Identificando o transtorno do pânico”).

O receio das grandes mudanças
Os ataques de pânico não têm causas definidas. A hipótese mais forte hoje em dia é a de que o sistema “lute ou fuja” do cérebro – desencadeado pela sensação ancestral de medo – está desequilibrado nas pessoas que sofrem desse problema. Mas é certo que os ataques têm relação com fatos traumáticos ou grandes (e em consequência estressantes) mudanças na vida, tais como um novo emprego, o nascimento de um filho ou a distância de um ente querido. No terreno bioquímico, estudos científicos propõem que as pessoas ansiosas podem ter um “sistema de alerta” (o conjunto de mecanismos físicos e mentais que leva uma pessoa a reagir a uma ameaça) extremamente sensível, que detecta falta de oxigênio até mesmo sob condições normais. Outra pesquisa, realizada na Universidade Yale, descobriu que indivíduos que sofrem ataques de pânico tinham menos receptores dos neurotransmissores serotonina e noradrenalina no cérebro. Além disso, há indícios de que a hereditariedade ajuda a aumentar a incidência do problema: se o pai, a mãe ou um irmão da pessoa apresenta ocorrências do gênero, a probabilidade que ela também as tenha é multiplicada por seis.

Um indivíduo que sofre com ataques de pânico crônicos confunde facilmente as sensações do seu organismo. Um batimento cardíaco acelerado pode ser visto como um ataque do coração, por exemplo. Se isso deflagra o medo na pessoa, os sintomas se intensificam ainda mais. É o que se chama de “medo do medo”.

Quem sofre ataques de pânico fica tão assustado com eles que se esforça para evitar tudo que possa lembrá-los. Uma crise num elevador, por exemplo, pode levar a pessoa não só a nunca morar num prédio de apartamentos como a evitar trabalhos e outras atividades que envolvam o uso desse meio de transporte. O problema pode se ampliar por associação: a pessoa que tenha entrado em pânico num trem pode se recusar a viajar de novo por ferrovias e, em seguida, estender sua restrição a carros, ônibus e aviões. O processo pode levar as pessoas acometidas pelo problema a limitarem tanto sua vida que passam a só sair de casa se acompanhadas pelo cônjuge ou por uma pessoa de absoluta confiança (é o que se chama de agorafobia, ou medo de espaços abertos).

Cerca de 1/3 das pessoas que sofrem ataques ocasionais de pânico desenvolve o TP. Embora haja registros de ataques em proporções iguais para homens e mulheres, estas apresentam uma tendência duas vezes maior de desenvolver o transtorno. O problema ocorre com maior frequência entre os 20 e os 35 anos de idade. Não há registros de crianças com essa doença.

Para tratar do TP, uma terapia cognitivo-comportamental (nome dado à psicoterapia estruturada, direta e de curta duração) é fundamental – em 80% dos casos, ela sozinha já leva o paciente à cura. Em geral, o tratamento psicoterapêutico abrange a exposição a sensações físicas de pânico; quando os pacientes descobrem que elas não representam o fim do mundo, ganham condições de enfrentá-las com sucesso. Casos mais graves podem exigir uma associação com medicamentos.

O medo irracional
Diferentemente do TP, no qual não há estímulos externos, a fobia é um sentimento de temor ou pânico desproporcional em relação a certos eventos, atividades ou objetos. Essa sensação impede que a pessoa avalie a situação de forma realista e, embora perceba que o medo é exagerado, ela não consegue evitar a ansiedade. Os sintomas desaparecem quando o estímulo deflagrador do acesso some de vista.

Considera-se que cerca de 10% da população mundial sofre de fobias específicas. Há fobias em relação aos mais variados objetos ou situações – até mesmo alguém fantasiado de palhaço ou de Papai Noel pode causar uma experiência do gênero. Os casos mais frequentes envolvem cachorros, água, lugares fechados, alturas, elevadores, escadas rolantes, túneis, dirigir carros, voar de avião e ferimentos com sangue. A ocorrência do problema é aparentemente ilógica: uma pessoa acometida de fobia pode ser, por exemplo, uma exímia montanhista e não conseguir entrar num elevador para ir ao 4º andar. Essa contradição traz derivações na fase adulta: mesmo percebendo que esses temores não são racionais, o indivíduo pode ter acessos de pânico ou de ansiedade severa ao ficar diante do motivo da fobia, ou simplesmente ao pensar nele.

Não se sabe exatamente quais são as causas das fobias específicas, embora também nesses casos a genética tenha seu papel. Elas aparecem mais frequentemente na infância e na adolescência, e tendem a prosseguir na fase adulta. A incidência em mulheres é duas vezes superior à observada nos homens.

Em diversos casos, o elemento deflagrador da fobia é encontrado tão raramente pela pessoa que um tratamento pode ser dispensável. Quando o caso passa a afetar a vida pessoal e profissional, porém, é hora de procurar atendimento adequado. Em geral, a psicoterapia já é suficiente para resolver o problema.

A vida em sociedade como ameaça
A fobia social (também conhecida como desordem de ansiedade social) é uma variante das fobias relativa a eventos sociais. Os motivos deflagradores da crise podem ser tão triviais quanto uma conversa com uma pessoa recém-apresentada ou o ato de escrever num quadro-negro diante dos colegas de classe. As pessoas que sofrem desse mal sentem um temor intenso e crônico de ser observadas e julgadas por outras. A sensação de medo em relação a essas situações pode ir de dias a semanas, o que em geral acarreta sequelas na vida pessoal, nos estudos e no trabalho, e leva a pessoa a isolar-se. Em certos casos, o número de situações motivadoras da crise eleva-se tanto que a vida social passa a ser restrita aos familiares e amigos mais próximos.

A pessoa acometida pela fobia social fica muito ansiosa antes do evento indesejado, extremamente desconfortável ao longo dele e preocupada com o julgamento dos outros durante várias horas depois. Outros sintomas comuns a esse problema são sudorese, tremores, náusea, rubor na face e dificuldades para falar.

A fobia social normalmente aparece na infância ou no início da adolescência, e também demonstra ligação com fatores hereditários. Os cálculos estão longe de ser precisos, mas estima-se que entre 7% e 13% da população apresentem o problema. Em termos de gênero, esse distúrbio é mais democrático: as proporções de casos em homens e mulheres são semelhantes. Como o transtorno pode ser facilmente confundido com a timidez, há um risco de tentar superar a situação problemática recorrendo-se ao álcool e a outras drogas. A psicoterapia, em alguns casos aliada a remédios, consegue eliminar o mal.

Identificando o transtorno do pânico
São apresentados a seguir alguns dos principais sintomas do transtorno do pânico, listados pela Associação Nacional da Síndrome do Pânico. A ocorrência simultânea de quatro desses itens já indica a presença do TP.

Falta de ar
Dor ou desconforto no peito
Vertigem
Palpitações
Tremores nos braços e/ou nas pernas
Sudorese
Sufocamento
Náusea ou desconforto abdominal
Despersonalização
Anestesia ou formigamento
Ondas de calor ou calafrios
Medo de morrer
Medo de enlouquecer

Ataques sob controle
As técnicas de relaxamento são uma ótima alternativa para dissipar um ataque de pânico. Uma delas, proposta pela Clínica Mayo, é sintetizada a seguir. Importante: seus efeitos serão ampliados se o praticante tiver sono regular, seguir uma dieta sem cafeína e outros estimulantes e praticar exercícios físicos regularmente.

Sente-se ou deite-se numa posição confortável e feche seus olhos – Suas pálpebras devem ficar relaxadas.

Examine seu corpo mentalmente – Partindo dos dedos dos pés, esquadrinhe cada parte lentamente: pernas, quadris, abdômen, tórax, braços, mãos, dedos, pescoço e cabeça. Quando perceber algum sinal de tensão, dissolva-o com a mente.

Tensione os músculos em cada área do corpo – Mantenha os músculos retesados e conte até dez; depois, relaxe-os e passe para outra parte do corpo. Faça isso no rosto, nos ombros, nos braços, nas pernas e nas nádegas.

Permita que os pensamentos fluam pela sua mente, mas não se concentre em nenhum deles – Uma sugestão sadia é pensar que você está calmo e relaxado, que suas mãos estão pesadas e mornas (ou frias, se você for mais quente), que seu coração bate serenamente e que você se encontra absolutamente calmo.

Respire de forma lenta, regular e profunda durante o relaxamento – Quando estiver relaxado, pense que você se encontra no seu reduto preferido ou num lugar de grande calma e beleza. Dez minutos depois, volte gradualmente ao estado de vigília.

Traumas e compulsões devastadores
A lista de desordens de ansiedade engloba outros distúrbios, que ocasionalmente surgem no noticiário da imprensa. Conheça dois deles a seguir:

Transtorno de estresse pós-traumático – Esse distúrbio é deflagrado por uma provação à qual a pessoa foi submetida, na qual houve ferimento ou ameaça à integridade física. Quem desenvolve a doença não precisa ser a pessoa ferida; às vezes, basta o episódio ter ocorrido com alguém querido, ou o indivíduo tê-lo testemunhado. Entre os fatores desencadeantes do problema estão guerras, estupros, assaltos com violência, raptos e sequestros, acidentes com meios de transporte e desastres naturais como furacões ou terremotos.

Os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 em Nova York e Washington são um exemplo contundente de um fato capaz de causar esse problema. Cerca de 4% dos americanos que não viviam naquelas cidades desenvolveram a doença apenas por verem os ataques na TV. Em Nova York, 10% da população apresentou sintomas do distúrbio.

Além de se assustarem com facilidade, as pessoas acometidas por esse mal – desde crianças até idosos – podem apresentar apatia emocional (em especial com indivíduos mais próximos), desinteresse em relação a coisas e atividades antes apreciadas, dificuldade em demonstrar carinho, aumento de acessos de irritação, agressividade ou violência. Há um esforço deliberado para fugir de situações que lembrem o incidente de origem, o que sempre torna a data de aniversário do fato uma ocasião complicada.

A maioria das pessoas que apresentam o problema revive o episódio inicial constantemente, tanto acordada quanto no sono. Essas rememorações são acionadas por fatos corriqueiros, como uma porta batendo ou o barulho do escapamento de um carro.

As mulheres são mais vulneráveis que os homens à doença. Em geral, ela vem acompanhada por problemas como depressão e outras desordens de ansiedade.

Os sintomas da moléstia devem durar pelo menos um mês para o diagnóstico ser definido. Embora eles apareçam geralmente três meses após o incidente inicial, por vezes o distúrbio só emerge anos depois. A recuperação pode demorar de seis meses a vários anos, e em alguns casos a doença se torna crônica. Tratamentos à base de remédios e de psicoterapia conseguem a cura completa.

Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) – Conhecido por acometer, entre outros, o cantor Roberto Carlos, o milionário Howard Hughes e o escritor Melvin Udall (personagem do filme Melhor É Impossível que rendeu o Oscar a Jack Nicholson), esse distúrbio é caracterizado por pensamentos persistentes e angustiantes e o uso de rituais (compulsões) para controlar a ansiedade que eles causam. Na maioria dos casos, esses rituais conseguem êxito, mas por um período limitado. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o TOC está entre as dez maiores causas de incapacitação. Mesmo assim, supõe-se que muitas pessoas que sofrem desse mal nunca foram diagnosticadas – e, portanto, não receberam tratamento.

As compulsões são variadas. Roberto Carlos nega-se a cantar certas músicas de seu repertório e obriga-se a entrar e sair pela mesma porta. A obsessão com sujeira levava Hughes e Udall a lavar repetidamente as mãos. Quem desenvolve um TOC relacionado a intrusos pode trancar as portas várias vezes antes de ir para a cama. A lista inclui ainda a preocupação com a ordem e a simetria, a verificação ou a contagem repetida de objetos, pensamentos proibidos por crenças religiosas e a dificuldade de jogar coisas fora (o que leva a pessoa a acumulá-las).

Presente em cerca de 2% da população mundial, o TOC é observado em proporções semelhantes em homens e mulheres. A doença em geral aparece pela primeira vez na infância, na adolescência e no início da fase adulta, e pode ser acompanhada por outras desordens de ansiedade, depressão e problemas alimentares. A genética parece influenciar sua incidência.

O desenrolar do distúrbio não é uniforme. Os sintomas podem surgir e desaparecer, ficar ausentes por um bom tempo até ressurgir mais adiante – e, em 10% dos pacientes, isso ocorre em grau mais severo. Nesse último caso, a pessoa fica incapacitada de trabalhar ou de fazer atividades domésticas.

O tratamento do TOC usa remédios e psicoterapia cognitivo-comportamental. Com isso, a doença fica sob controle e, em muitos casos, desaparece totalmente.

Por Zé Carlos Borges
WhatsApp (74) 99140 5525
Com informações de Brasil 247

Leia também

Zé Carlos Borges

Seu maior portal de notícias agora com uma nova cara, para satisfazer ainda mais seu interesse pela informação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário